sexta-feira, 13 de julho de 2012

Esofagite Eosinofílica. Um novo diagnóstico… Histológico!

Andreia Rei


A descoberta de uma nova entidade nosológica é sempre um acontecimento entusiasmante. Porque despoleta uma diversidade de novas interrogações e o desafio de alcançar novos e mais ricos conhecimentos.
Partindo das características histológicas do esófago já estudadas, propõe-se a descoberta de uma nova doença esofágica inflamatória, a Esofagite Eosinofílica (EoE).

A Esofagite Eosinofílica é uma condição clinicopatológica caracterizada por inflamação eosinofílica e fibrose submucosa circunscrita ao esófago. Representa uma doença crónica, mediada pelo sistema imune, caracterizada clinicamente por sintomas de disfunção esofágica e histologicamente por inflamação com predominância de eosinófilos.
Em 2007 foi publicado um consenso de recomendações clínicas e histopatológicas de diagnóstico da EoE, revisto em 2011, com o objectivo de clarificar o estado da investigação bem como orientar os clínicos para o diagnóstico.
Mediante um crescente reconhecimento nosológico, a doença tem sido mais diagnosticada e por conseguinte começa a revelar-se mais prevalente. Considera-se que afecta em estimativa >1/1.000 indivíduos, mais frequentemente do sexo masculino e crianças, de raça caucasiana. O diagnóstico fidedigno é realizado por endoscopia digestiva alta e biopsia da mucosa esofágica, que deve apresentar uma infiltração de eosinófilos de pelo menos >15 eosinófilos por campo de grande aumento. É sugerido um padrão familiar que pode ser importante na manifestação da doença. Em pelo menos metade dos pacientes está presente uma história de atopia, alergia alimentar, asma, eczema ou rinite alérgica. Estes indicadores contribuem para a hipótese de se tratar de uma perturbação alérgica induzida por sensibilização antigénica em indivíduos susceptíveis. A literatura documenta um importante papel dos alergenos alimentares tanto na patogénese como no tratamento da EoE. A apresentação clínica varia com a idade do doente: na criança pequena pode cursar com atraso do desenvolvimento e recusa na deglutição, enquanto em crianças mais velhas surgem queixas de vómitos, regurgitação e dor retroesternal. Nos adolescentes é frequente surgir dor retrosternal em queimação e dispepsia. No adulto surge comumente disfagia e impactação alimentar, bem como pirose, muitas vezes refractária a Inibidores da Bomba de Protões (IBPs).
Existe uma sobreposição não completamente compreendida mas relevante entre EoE e Doença de Refluxo Gastro-Esofágico (DRGE) que pode confundir e adiar o diagnóstico. Têm surgido esforços científicos no sentido de diferenciar estas duas patologias no que respeita a características clínicas, endoscópicas e histológicas. Dellon et al. (2009) aponta alguns factores que parecem distinguir a EoE, nomeadamente: maior densidade eosinofílica; desgranulação dos eosinófilos; idade mais precoce de surgimento da doença; presença documentada de alergias alimentares; sintomas de disfagia; presença de anéis esofágicos, exsudados e manchas focais na endoscopia; ausência de hérnia do hiato. Para além da DRGE, é necessário fazer diagnóstico diferencial da EoE com gastrenterite eosinofílica, anéis esofágicos e estreitamentos esofágicos.
As características endoscópicas encontradas na EoE, reveladas na figura 1, incluem: A. múltiplos anéis circulares. Podem estar presentes: exsudados punctiformes, sulcos lineares, manchas focais esbranquiçadas e estreitamento esofágico.

Fig. 1: Achados endoscópicos na EoE (Harrison, 18th edition).

Em termos de características histológicas, as figuras 2 e 3 revelam as características mais frequentemente encontradas. 


 Fig. 2: Características histológicas da mucosa esofágica na EoE (Liacouras et al., 2011). 
A. mucosa esofágica normal; B. grande densidade eosinofílica; C. Eosinófilos dispostos superficialmente; D. Microabcessos eosinofílicos.
Fig. 3: Características histológicas da mucosa esofágica na EoE (GI Motility online May 2006)
a. Eosinófilos com disposição superficial; b. Microabcesso eosinofílico.

Outras características histológicas que podem estar presentes incluem: desgranulação e grânulos eosinofílicos extracelulares; hiperplasia das células basais; espaços intercelulares aumentados; fibrose da lâmina própria. 

Claro que muito está por descobrir…
Estes são alguns caminhos para desvendar a patologia: clarificar as características patognomónicas; compreender a patofisiologia de outros fenótipos presentes, nomeadamente com responsividade aos IBPs; identificar biomarcadores úteis para o diagnóstico; compreender o curso da doença e como lidar com as complicações; assegurar a importância de tratar doentes assintomáticos; investigar a eficácia de algumas terapêuticas praticadas.

Para mais informação, consultar:
Liacouras CA, et al. Eosinophilic Esophagitis: Updated consensus recommendations for children and adults. J Allergy Clin Immunol. 2011 Jul;128(1):3-20.

Dellon ES, et al. Clinical, endoscopic, and histologic findings distinguish eosinophilic esophagitis from gastroesophageal reflux disease. Clin Gastroenterol Hepatol. 2009 Dec;7(12):1305-13

Atkins D, et al. Eosinophilic esophagitis: the newest esophageal inflammatory disease. Nat Rev Gastroenterol Hepatol. 2009 May;6(5):267-78

Images In Clinical Medicine: Eosinophilic Esophagitis. N Engl J Med 2007. 356;20.

Harrison´s Principles of Internal Medicine, 18th edition

Boas descobertas!

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