quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Engenharia de tecidos: o futuro vem já aí...

Adelino Costa

Em junho de 2011, no Karolinska Institutet de Estocolmo, uma equipa multinacional de investigadores e clínicos implantou com sucesso o primeiro órgão artificialmente sintetizado a partir de células do próprio recetor do novo órgão.
A transplantação, a transfusão e o enxerto são procedimentos fundamentais na reparação, ou substituição, de tecidos e órgãos lesados que o corpo já não consegue reparar mesmo com ajudas terapêuticas. Porém são técnicas complexas e com diversas limitações, as mais importantes das quais são a dificuldade em encontrar dadores compatíveis, a elevada proporção de rejeição pelo recetor e a morbilidade que implica para o dador vivo. Uma nova abordagem, a engenharia de tecidos, propõe soluções para este problema: tecidos e órgãos à medida de quem precisa. Parece ficção, mas não é.
As técnicas cuja investigação e aplicação se conhece assentam em alguns elementos comuns como são o uso de estruturas de suporte para o crescimento do tecido, colonização dessas estruturas com células de elevado potencial de proliferação e diferenciação, modulação do crescimento e diferenciação com fatores adequados, cultura dos tecidos em biorreatores e implantação no recetor.
A estrutura de suporte é uma matriz que permite a adesão, proliferação e migração celular, oferecendo o necessário suporte para que o crescimento do tecido ocorra estruturadamente. A configuração mais frequente é a de uma malha microporosa de polímeros de consistência gelatinosa, esponjosa ou fibrosa, empregando substâncias naturais como proteínas (colagénio, fibrina, gelatina) e polissacáridos (alginato, agarose, ácido hialurónico, chitosan, goma gelana), que estão presentes na matriz extracelular naturalmente ocorrente nos tecidos, ou substâncias sintéticas como polietilenos, poliálcoois, polímeros peptídicos e mesmo substâncias inorgânicas como cerâmica (
1-6). Algumas abordagens fazem uso de substâncias compósitas em que diferentes substâncias das acima mencionadas são combinadas, aproveitando as suas vantagens e diminuindo as limitações, como por exemplo a combinação de cerâmica com polissacáridos, retendo as propriedades estruturais daquela com as biológicas destes. A figura 1 representa a aparência macroscópica e microscópica que estas estruturas adquirem.


Fig.1: Aspeto macroscópico de uma estrutura de suporte (esq.); aspetos microscópicos de
estruturas de suporte (dir.)

As principais características preconizadas para estas estruturas são a capacidade de permitirem a adesão, proliferação, migração e diferenciação celular e tecidular, a biocompatibilidade com o ambiente in vivo do recetor, a baixa imunogenicidade, propriedades mecânicas que permitam a flexibilidade preservando a estrutura, a biodegradabilidade, permitindo às células e matriz ocupar todo o tecido (2). A aplicação de proteínas e polissacáridos naturalmente presentes na matriz extracelular têm-se revelado particularmente adequadas para estes fins. Os polímeros peptídicos são alvos preferenciais da investigação neste campo uma vez que permitem uma variedade de conformações e de organização à escala nanométrica, incluindo a integração com outras moléculas orgânicas, e a modelação da estrutura concomitante com o crescimento do tecido propriamente dito, em ambientes controlados, tornando possível uma adequação mais precisa do tecido/órgão (7).O fabrico destas estruturas aplica duas abordagens principais: avançadas técnicas de microengenharia biomolecular e a descelularização de tecidos e órgãos naturais. Esta última permite preservar a matriz natural, removendo as células e outros elementos indesejados, como antigénios ou associados à rejeição, permitindo a posterior colonização com células apropriadas à formação e desenvolvimento do tecido ou órgão que se pretende criar (fig. 2)(8). Esta técnica já foi aplicada clinicamente com sucesso, porém contínua a requerer um dador (5).


Fig. 2: Descelularização do coração (rato): aspetos macroscópico, em diferentes etapas, e histológico final

As estruturas de suporte são colonizadas com células que são os artífices principais do crescimento e desenvolvimento do novo tecido. Elas aderem, proliferam, migram e, possuindo potencial, diferenciam-se dando origem às células do novo tecido, produzindo ainda a matriz extracelular que o vai complementar, até que um novo tecido surge e a própria estrutura de suporte inicial é degradada e substituída. As células estaminais, pelo seu elevado potencial de diferenciação, são preconizadas como as mais adequadas para este fim. São colhidas de duas origens principais: embrionária (embriões, cordão umbilical e líquido amniótico) e células estaminais mesenquimatosas (MSC) (fig. 3). Embora as primeiras possuam maior potencial de diferenciação, estão disponíveis em pequenas quantidades e o seu uso levanta problemas éticos. Já as segundas existem no corpo de todas as pessoas, são facilmente acessíveis e possuem uma série de características que parecem fazer delas a solução ideal: parecem possuir pluripotencialidade (potencial em se diferenciarem em qualquer célula originária dos três tecidos embrionários: ectoderme, mesoderme e endoderme), não possuem imunogenicidade já que são do próprio recetor (autólogas), baixa propensão oncogénica e podem ser cultivadas em meios in vitro. São facilmente acessíveis em vários tecidos, particularmente entre as células progenitoras da medula óssea e no tecido adiposo. Uma terceira fonte de células para engenharia de tecidos são as células estaminais induzidas, células somáticas que são desdiferenciadas, i.e. revertidas à condição de células pluri ou multipotenciais, via engenharia genética, porem a sua aplicabilidade ainda não foi testada clinicamente ao contrário das anteriores.
Como muitos destes procedimentos são desenvolvidos ex vivo são necessários equipamentos destinados a garantir o ambiente adequado para que tal suceda, estes equipamentos são denominados biorreatores. No fundamental procuram replicar as condições in vivo sobretudo ao nível de oxigenação, nutrição, fatores de crescimento e desenvolvimento tecidular e condições físicas (ex. temperatura). A fig. 4 apresenta uma imagem de um biorreator, usado para a síntese da traqueia e brônquios referidos num caso clínico adiante.



Fig. 3: Pluripotencialidade das MSC (esq.; MSC (dir.).

A fim de promover e modular o desenvolvimento do novo tecidos são usados fatores bioquímicos, presentes nos processos naturais de crescimento e desenvolvimento tecidular, doseados nas estruturas de suporte e biorreatores. Entre os fatores usados incluem-se fatores de crescimento, os mais comuns, integrinas, mitogénios, etc. (5, 6). Alguns investigadores preconizam também o uso de farmacoterapia com o propósito de modular a resposta inflamatória que o recetor tende a desenvolver sobre o implante (5).



Fig. 4: Biorreator (9)


Histologicamente os tecidos produzidos por engenharia revelam uma parecença notável com os seus correspondentes naturais, como a seguir se apresenta.A figura 5 apresenta cortes histológicos tecido osteocondral de uma falange artificial desenvolvida em contexto laboratorial (10). Em a (corado com safranina O) é possível distinguir uma zona de crescimento de tecido cartilagíneo (C) e uma zona de crescimento ósseo (S). Em b apresentam-se sucessivas zonas de crescimento cartilagíneo: tangencial, transitório e radial. Em c e d apresenta-se tecido ósseo podendo ser distinguido osso trabecular (T), bem como reminiscências da estrutura de suporte (P).

Fig. 5: Tecido osteocondral de falanges artificiais

A fig. 6 apresenta regiões articulares interfalângicas: em a e b duas imagens, com diferente magnitude, de uma articulação interfalângica em que JC é o espaço sinovial e a seta aponta para a cápsula sinovial, sendo C tecido cartilagíneo adjacente; c e d referem-se a outra articulação podendo diferenciar-se em c diferentes zonas crescimento condral (tangencial (TA) e transitório (TR)) e em condrócitos hipertrofiados (HC), junto a resíduos poliméricos da estrutura de suporte (10).

Fig. 6: Tecido cartilagíneo articular
A figura 7 apresenta imagens histológicas de tecido epitelial de revestimento (pele), coradas com tricrómio de Masson, com duas técnicas diferentes de engenharia. É possível visualizar a clara e precisa diferenciação do tecido sintetizado, que apresenta inclusive produção de queratina (C). As setas indicam resquícios da estrutura de suporte ainda não substituídos pelo novo tecido.


Fig. 7: Pele artificial

Já a figura 8 apresenta duas imagens, com colorações diferentes (HE e tricrómio de Masson) de tecido ósseo sintético em que é possível ver o tecido em crescimento em redor de porosidades constituídas de vasos e resíduos da estrutura de suporte(11).




Fig. 8: Tecido ósseo

Os tecidos cartilagíneo, ósseo e epitelial de revestimento têm-se revelado os mais propícios à engenharia, sendo a sua investigação e aplicação clínica a mais avançada. A engenharia de tecidos tem produzido tecidos e órgãos para uso terapêutico, como traqueia, bexiga, pele, cartilagem, vasos sanguíneos e válvulas cardíacas, córnea e trato urinário (3, 5). Estes produtos têm sido sobretudo usados para reparação parcial de tecidos lesados (cartilagem e pele), sendo a implantação de órgãos completos muito recente.

Fig. 9: Osso (esq.) e tecido epitelial (dir.) artificiais

A implantação do novo tecido/órgão no recetor é a ultima etapa deste processo, levantando importantes desafios. Os investigadores e os clínicos que já precederam a intervenções terapêuticas recorrendo a estas soluções procuram perceber qual o melhor momento para implantação e como assegurar a interligação ao ambiente que rodeia o tecido/órgão implantado, nomeadamente aos níveis vascular e nervoso, ao mesmo tempo inibindo eventuais reações adversas, nomeadamente inflamatórias, imunitárias ou oncogénicas. O caso com que se abre este artigo, e adiante descrito, oferece uma perspetiva reveladora sobre estas questões.
O recetor do novo órgão, uma traqueia e brônquios principais, sofria de uma neoplasia (carcinoma mucoepidermoide) da traqueia que havia invadido os brônquios superiores, sem haver metastizado, e era refratário às terapêuticas convencionais. Sem outra solução que a transplantação a equipa liderada pelo Dr. Paolo Macchiarini, já com experiência em transplantações de órgãos artificiais, optou pela abordagem inovadora de implantar um órgão sintetizado com células do próprio utente, e não de um dador como sucedera até então noutros casos. Usando MSC e células progenitoras colhidas de medula óssea para a matriz do novo órgão, induzidas a diferenciarem-se em condrócitos, e células epiteliais nasais para o epitélio interior, as células foram implantadas numa estrutura de suporte microporosa sintética, que foi depois colocada num birreator. Defendendo que uma manipulação ex vivo excessiva pode conduzir à deterioração do novo tecido e ao ganho de propriedades imunogénicas, o Dr. Macchiarini e colegas implantaram o novo órgão 36h depois (fig. 11).


Fig. 10: Traqueia artificial (estrutura de suporte)

A figura 12 apresenta imagens histológicas do seguimento pós-operatório aos 2 meses: iv apresenta tecido de granulação associado a inflamação; v e vi epitélio respiratório com células secretoras de muco; vii metaplasia de epitélio escamoso (vermelho) (9). Aos 4 meses os clínicos reportam que o utente se apresenta sem problemas associados à implantação (5).





Fig. 11: Imagens histológicas pós-operatórias a implantação de traqueia e brônquios artificiais

Sucessos como este não podem, porém, iludir quanto aos muitos desafios que ainda falta responder. No imediato encontram-se o controlo de reações inflamatórias e imunitárias, o risco de carcinogénese dos novos tecidos (relacionado com a pluripotencialidade das células usadas), a vascularização e inervação, e a engenharia de órgãos, complexos com coração ou fígado. A vascularização parece ser o principal desafio pois há limitações na capacidade em construir tecidos, e mais ainda órgãos, adequadamente vascularizados (as células não sobrevivem a mais que algumas centenas de micrómetros dos capilares) e conectáveis à vasculatura do recetor, estudando-se presentemente a combinação de microvasculaturas sintetizadas previamente à colonização celular com a implantação e proliferação de endotelócitos associada a essas miscroestruturas vasculares (3)
Algumas descobertas já em estudos avançados, como o uso de MSC como células progenitoras dos novos tecidos, e polímeros peptídicos para a construção de matrizes de suporte e vasculatura, como acima descritos, oferecem perspetivas animadoras, e num futuro não muito distante poderá ser possível a implantação de órgãos feitos à medida do recetor e as dificuldades de fornecimento de bancos de sangue ser erradicadas.

Agradecimento a J. T. Oliveira pela cortês disponibilização da publicação de que é co-autor citada na bibliografia.

Bibliografia
1. Oliveira JT, Reis RL. Polysaccharide-based materials for cartilage tissue engineering applications. Journal of tissue engineering and regenerative medicine. 2011;5(6):421-36. Epub 2010/08/27.
2. Sachlos EC, J. T. . European Cells and Materials. 2003;5:29-40.
3. Gauvin R, Guillemette M, Dokmeci M, Khademhosseini A. Application of microtechnologies for the vascularization of engineered tissues. Vascular cell. 2011;3:24. Epub 2011/11/02.
4. Sakiyama E. Combining stem cells and biomaterial scaffolds for constructing tissues and cell delivery. StemBook. 2008.
5. Jungebluth P, Moll G, Baiguera S, Macchiarini P. Tissue-engineered airway: a regenerative solution. Clinical pharmacology and therapeutics. 2012;91(1):81-93. Epub 2011/12/02.
6. Gardin C, Vindigni V, Bressan E, Ferroni L, Nalesso E, Puppa AD, et al. Hyaluronan and fibrin biomaterial as scaffolds for neuronal differentiation of adult stem cells derived from adipose tissue and skin. International journal of molecular sciences. 2011;12(10):6749-64. Epub 2011/11/11.
7. Webber MJ, Kessler JA, Stupp SI. Emerging peptide nanomedicine to regenerate tissues and organs. Journal of internal medicine. 2010;267(1):71-88. Epub 2010/01/12.
8. Ott HC, Matthiesen TS, Goh SK, Black LD, Kren SM, Netoff TI, et al. Perfusion-decellularized matrix: using nature's platform to engineer a bioartificial heart. Nature medicine. 2008;14(2):213-21. Epub 2008/01/15.
9. Jungebluth P, Alici E, Baiguera S, Le Blanc K, Blomberg P, Bozoky B, et al. Tracheobronchial transplantation with a stem-cell-seeded bioartificial nanocomposite: a proof-of-concept study. Lancet. 2011;378(9808):1997-2004. Epub 2011/11/29.
10. Isogai N, Landis W, Kim TH, Gerstenfeld LC, Upton J, Vacanti JP. Formation of phalanges and small joints by tissue-engineering. The Journal of bone and joint surgery American volume. 1999;81(3):306-16. Epub 1999/04/13.
11. Zhao L, Zhao JL, Wan L, Wang SK. The study of the feasibility of segmental bone defect repair with tissue- engineered bone membrane: a qualitative observation. Strategies in trauma and limb reconstruction. 2008;3(2):57-64. Epub 2008/04/23.


Figuras (de outras fontes)
Figura 1: http://www.cellsupports.com/index.html e http://www.ecr6.ohio-state.edu/mse/faculty/powell/
Figura 3: http://www.nature.com/nri/journal/v8/n9/fig_tab/nri2395_F1.html e http://en.wikipedia.org/wiki/Mesenchymal_stem_cell
Figura 7: http://www.ecr6.ohio-state.edu/mse/faculty/powell/
Figura 9: http://www.childrenshospital.org/gallery/index.cfm?G=45&page=14 e http://science.nationalgeographic.com/science/enlarge/skin-tissue-culture.html

Figura 10: http://yourlife.usatoday.com/health/story/2011/07/Patient-gets-worlds-first-artificial-trachea/49176868/1

terça-feira, 17 de janeiro de 2012

Pele – o Processo de Envelhecimento

Sara Ramos



A pele é um dos maiores órgãos do corpo humano, atingindo16% do peso corporal. Apresenta múltiplas funções entre as quais, protecção contra a perda de água e elctrólitos, termorregulação e secreção, entre outras.

A pele recobre a superfície do corpo e apresenta-se constituída por uma porção epitelial queratinizado de origem ectodérmica, a epiderme, e uma porção conjuntiva de origem mesodérmica, a derme. Abaixo e em continuidade com a derme está a hipoderme, que, embora tenha a mesma origem da derme, não faz parte da pele, apenas lhe serve de suporte e união com os órgãos subjacentes.



Figura 1 – Corte esquemático da estrutura da pele


Figura 2 – Fotomicrografia das várias camadas da pele


As células da epiderme são de quatro tipos diferentes:
· Queratinócitos;
· Melanócitos;
· Células de Langerhans;
· Células de Merkel.

Figura 3 – Diagrama e micrografia dos componentes celulares da epiderme


A derme está dividida em duas zonas contíguas que diferem na sua composição e disposição histológica:
· Camada papilar (imediatamente abaixo da epiderme): tecido conjuntivo laxo não ordenado;
· Camada reticular: tecido conjuntivo denso não ordenado.


Figura 4 – Corte histológico da derme
(PL – Camada papilar; RL – Camada reticular; EF – Fibras elásticas)

Na pele encontram-se ainda várias estruturas anexas, tais como pêlos, unhas, glândulas sebáceas e glândulas sudoríparas.



Figura 5 – Fotomicrografia de uma glândula sebácea

O envelhecimento da pele é um processo normal, individual e gradativo, que caracteriza uma etapa da vida onde ocorrem modificações fisiológicas, bioquímicas e psicológicas em consequência da acção do tempo. É uma fase onde ocorrem manifestações somáticas no ciclo natural da vida, pois caracteriza-se pela perda progressiva da capacidade de adaptação e de reserva do organismo diante das mudanças que irão influenciar de maneira decisiva na vida do indivíduo.

Alterações do tecido cartilagíneo na condromalácia

José Brites
Alterações do tecido cartilagíneo - CondromaláciaNesta publicação abordar-se-á o tecido cartilagíneo, especificamente a cartilagem hialina, que constitui a face posterior da rótula e os côndilos do fémur.
Em praticantes de determinados desportos ou atividades profissionais de impliquem impacto nesta zona do corpo, pode ocorrer uma lesão relacionada com a degeneração da cartilagem nestas duas superfícies articulares, originando-se assim a condromalácia.
Cartilagem, um tecido especial? Porquê?O tecido cartilagíneo é um tipo de tecido conjuntivo com características que lhe permitem resistir a stresse mecânico sem que isso implique a perda permanente da sua forma inicial. Isto deve-se ao facto das células que o constituem, os condrócitos (do Grego chondros=cartilagem + kytos=célula) se encontrarem em lacunas da matriz extracelular, que é composta por fibras elásticas e de colagénio de diversos tipos (dependendo do tipo de cartilagem) e substâncias como o ácido hialurónico, proteoglicanos e pequenas quantidades de glicoproteínas (composição que varia consoante o tipo de cartilagem a que nos referirmos).
Dada a elasticidade da elastina e do colagénio, a consistência espessa, porém, gelatinosa da cartilagem depende não só das ligações electroestáticas entre as fibras de colagénio e as cadeias laterais dos glucosaminoglicanos dos proteoglicanos da matriz extracelular, mas também da afinidade da água de solvatação com as cadeias negativas de glucosaminoglicanos que se estendem desde o núcleo proteico dos proteoglicanos.

Quantos tipos de cartilagem existem e onde se podem encontrar no organismo?
Dependendo do tipo de função que desempenham, podemos distinguir três tipos de cartilagem com composições matriciais diferentes: (Fig. 1)


- Cartilagem hialina: Tem um aspeto translúcido e é a mais abundante no organismo humano, apresentando grandes quantidades de colagénio tipo II (podemos encontrá-la na maioria das articulações, na cartilagem costal, nas cartilagens nasais, nos anéis cartilagíneos do sistema respiratório e nas placas epifisárias responsáveis pelo crescimento longitudinal dos ossos);


- Cartilagem elástica: Como o nome indica, este tipo de cartilagem é a mais “deformável” das três, pois possui, em conjunto com o colagénio do tipo II, uma grande quantidade de fibras elásticas na sua matriz (podemos encontrá-la no pavilhão auricular e na epiglote);


- Cartilagem fibrosa: A cartilagem fibrosa é a mais resistente das apresentadas, possuindo uma elevada capacidade de absorção de impacto mecânico (podemos encontrá-la nos discos vertebrais, na sínfise púbica e nos meniscos dos joelhos).



Figura 1 – Distribuição e tipos de cartilagem do humano adulto.
Legenda: a) Distribuição da cartilagem no humano adulto.
b) Cartilagem hialina.
c) Cartilagem fibrosa.
d) Cartilagem elástica.


Sendo um tecido avascular, como se nutrem os condrócitos?Apresentando uma vascularização praticamente inexistente, os condrócitos são nutridos principalmente pelos nutrientes difundidos pelos capilares dos tecidos conjuntivos adjacentes (pericôndrio), ou absorvendo nutrientes dissolvidos no líquido sinovial da articulação; existem ainda zonas onde a cartilagem é atravessada por grandes vasos, mas que servem apenas para nutrir tecidos adjacentes à cartilagem.
Por estas razões, o metabolismo dos condrócitos varia diretamente com a taxa de irrigação de determinado local e é, na maioria dos casos, baixo, tornando este tecido um tecido com uma capacidade de regeneração relativamente baixa.
O pericôndrio é uma camada de tecido conjuntivo denso, (acidófilo (Fig. 1a)) que apresenta nervos, vasos sanguíneos e linfáticos, rodeando a cartilagem e que faz a interface entre a cartilagem e o tecido que a suporta (no caso em estudo é o tecido ósseo). Os próprios condrócitos têm origem nos fibroblastos do pericôndrio (Fig. 2b), que se diferenciam em condroblastos a partir deste e migram em direção ao espaço articular, tornando-se condrócitos e alimentando-se à medida que se afastam, do líquido sinovial articular do qual conseguirão retirar nutrientes e oxigénio.

Figura 2 – Corte histológico e esquema de diferenciação de condrócitos.
Legenda: a) Imagem histológica de secção cartilagem hialina (200x).
b) Esquema de diferenciação de condrócitos

Review da cartilagem hialina…É, de longe a mais comum dos três tipos e também a melhor estudada. Nos adultos, a cartilagem hialina está presente nas superfícies articulares (e noutros locais já referidos) e deve o seu nome ao facto de apresentar uma cor esbranquiçada e translúcida; no embrião a cartilagem hialina serve de esqueleto temporário enquanto vai sendo gradualmente substituída por osso.
Este tipo de cartilagem apresenta uma matriz rica em colagénio, proteoglicanos (que formam agregados, os glucosaminoglicanos (GAG’s) (Fig. 3)), glicoproteínas estruturais e água.

Figura 3 – Representação esquemática das moléculas mais abundantes na matriz extra celular.

Cerca de 75% do peso líquido da cartilagem hialina deve-se à água, este alto conteúdo de água de solvatação ligada às cargas negativas dos GAG’s, torna esta cartilagem perfeita para servir de amortecedor biomecânico nos choques sofridos pelas articulações.
Os condrócitos apresentam formas diferentes consoante o seu estado de maturidade e a proximidade ao pericôndrio em oposição à superfície articular, assim sendo, próximo do pericôndrio, os condrócitos apresentam uma forma mais elíptica tornando-se mais arredondados à medida que se afastam do pericôndrio. Podem também agregar-se em grupos (até oito) a partir da divisão mitótica de um único condrócitos, grupo que se denomina de agregado isogénico e que se separa assim que se intensifica a produção de matriz.
Na cartilagem hialina, dadas as dificuldades de irrigação, a respiração processa-se com uma baixa concentração de oxigénio, os nutrientes difundem-se do sangue para o pericôndrio e deste até aos condrócitos e o transporte de água e solutos é promovido por uma espécie de bomba que funciona através da pressão e descompressão do tecido cartilagíneo durante o movimento articular. A função dos condrócitos é regulada por hormonas, sendo a síntese de GAG’s sulfatados estimulada pela hormona do crescimento, tiroxina e testosterona e inibida pela cortisona, hidrocortisona e estradiol.



Condromalácia (do Grego chondros=cartilagem + malakía=debilidade)
Para muitos a palavra condromalácia (também conhecida como dor patelo-femoral, ou "joelho de corredor") é sinónimo de:
· Dor crónica na região anterior do joelho (atrás da rótula);
· Dor a subir e descer escadas;
· Dor a sentar e levantar-se de uma cadeira;
· Dor ao manter o joelho fletido durante longos períodos de tempo;
· Dor durante a prática de exercício físico;
· Dor a conduzir;
· Dor ao pressionar (mesmo ao de leve) a rótula (Patella).
Podem ainda ocorrer outros sintomas como a crepitação e estalidos audíveis ou o derrame intra-articular.
A condromalácia é uma patologia que resulta do atrito/amolecimento/desgaste (Fig’s.4 e 6) da cartilagem hialina que reveste a face posterior da rótula e o sulco patelar do fémur, por motivos diversos: anatómicos, idade, corrida, desportos de impacto continuado na rótula, quedas em apoio sobre o joelho, rotação do fémur em relação à tíbia e perónio causando desalinhamento da rótula.


Figura 4 – Esquema de desalinhamento patelar.

Como o movimento de flexão (Fig. 5) é essencial à locomoção, por mais pequena que seja a deslocação ao início, pode transformar-se numa lesão grave ao fim de algum tempo:


Figura 5 – Movimento de flexão.
Figura 6 – Fotografias de artroscopia a rótula normal e com condromalácia.


Existem 4 graus de condromalácia (Classificação de Outerbridge):


- GRAU I: amolecimento da cartilagem.


- GRAU II: fragmentação e fissura da cartilagem numa área menor ou igual a aproximadamente 1,5 cm.


- GRAU III: fragmentação e fissura da cartilagem em uma área maior ou igual a aproximadamente 1,5 cm.


- GRAU IV: erosão da cartilagem com exposição do osso subcondral. (Fig.7)
Figura 7 – Ilustração de condromalacia de grau IV.

Sendo a rótula o maior osso sesamóide do corpo humano e se encontrar inserida num tendão é de prever que o pericôndrio que produz a cartilagem hialina tenha dificuldades em obter nutrientes, impedindo uma taxa de renovação condral semelhante à de desgaste, assim haverá uma dificuldade acrescida para a rótula em manter um nível saudável de cartilagem hialina, reduzindo-se a espessura desta, provocando a condromalácia e consequentemente, artrose.

Tratamento


O fortalecimento do quadríceps é fundamental, é necessário recuperar a potência do membro inferior, executando exercícios com um grau de dificuldade progressiva, evitando uma sobrecarga na articulação fémuro-patelar, excluindo exercícios e desportos de alto impacto (futebol, voleibol, basquetebol, corrida, ciclismo) ou atividades suspeitas de causarem a lesão. A natação é um bom exercício para manter a forma física sem afetar o joelho.
Figura 8 – Cinta de imobilização patelar.Podem usar-se cintas que impedem a mobilidade da rótula, diminuindo o desgaste (Fig.8), infiltrações com ácido hialurónico na articulação ou ainda recorrer a cirurgia de realinhamnto patelar (Fig.9).


Figura 8 – Cinta de imobilização patelar.
Figura 9 – Artroscopia com limpeza de cartilagem.

Relativamente aos fármacos, para além dos anti-inflamatórios durante os períodos de dor aguda, são aconselhados suplementos alimentares ou medicamentos que contenham glucosamina e condroitina, substâncias que ajudarão os condrócitos a repor mais rapidamente a cartilagem perdida, regenerando a zona lesada.
Bibliografia
Mescher, Anthony L.; Junqueira's Basic Histology: Text and Atlas, 12th Edition
McGraw-Hill Medical; 12 edition (August 28, 2009)
http://www.bbc.co.uk/health/physical_health/conditions/knee_cartilage.shtml
http://www.medterms.com/script/main/art.asp?articlekey=7887
http://en.wikipedia.org/wiki/Knee_cartilage_replacement_therapy#Autologous_matrix-induced_chondrogenesis
http://www.vitorcaine.com/patologias/joelho/condromalacia/condro.htm
http://clubedopilates.blogspot.com/2011/12/pilates-para-tratamento-e-prevencao-de.html

quarta-feira, 11 de janeiro de 2012

Nefrotoxicidade induzida por etilenoglicol

Helena Alves

Com esta publicação pretende-se fazer a correlação da histologia com a prática clínica, dando ênfase à importância da histologia no diagnóstico precoce da insuficiência renal aguda induzida por ingestão de etilenoglicol. Para isso recorreu-se ao livro Histologia Básica, 9ª ed e a vários artigos publicados na PubMed, tendo-se feito uma revisão bibliográfica.

Sistema Urinário
O sistema urinário contribui para a manutenção da homeostase, produzindo a urina, através da qual são eliminados diversos resíduos do metabolismo, além de água, electrólitos e não electrólitos em excesso no meio interno. É constituído por 2 rins, 2 ureteres, uma bexiga e uma uretra. A urina é produzida nos rins, passa pelos ureteres até à bexiga e é lançada para o exterior através da uretra. (Fig.1)



Figura 1


AlAlinhar à esquerdaém de regular o equilíbrio de água e electrólitos no organismo, os rins também secretam hormonas, como a renina, que participa na regulação da pressão sanguínea, e a eritropoietina, uma glicoproteína de 30kD, que estimula a produção de eritrócitos.


O rim é um órgão par, situado na cavidade abdominal, de cada lado da coluna vertebral e ao nível das últimas costelas. Tem a forma de um feijão, com o peso de aproximadamente 120 gr a 160 gr, de cor vermelho-escura. É constituído por uma cápsula fibrosa, fina e resistente, o cortéx e a medula. (Fig.2)

Figura 2


A medula é constituída por 10 a 18 pirâmides de Malpighi, cujos vértices fazem saliência nos cálices renais. Estas saliências são as papilas, sendo cada uma delas perfurada por 10 a 25 orifícios (área crivosa). Da base de cada pirâmide saem 400 a 500 raios medulares, que penetram na zona cortical.
Cada lobo renal é constituído por uma pirâmide pelo tecido cortical que recobre a sua base e os seus lados.
A unidade funcional do rim é o nefrónio (Fig.3). Cada nefrónio é constituído por uma parte dilatada, o glomérulo de Malpighi, pelo túbulo contornado proximal, pelas partes delgadas e espessa da ansa de Henle e pelo túbulo contornado distal; estas estruturas estão envolvidas por uma lâmina basal que se continua com o escasso tecido conjuntivo do rim. Os glomérulos e os túbulos contornados (proximal e distal) são corticais, enquanto as duas porções da ansa de Henle, rectilíneas, encontram-se na medula.(1)

Figura 3

Na medula observam-se os tubos colectores e a ansa de Henle.

Figura 4
Legenda: A estrela indica um túbulos colectores revestidos por epitélio cúbico simples.
A seta aponta um segmento delgado da ansa de Henle.


No córtex podemos observar os glomérulos de Malpighi, os túbulos contornados proximais e os túbulos contornados distais. Cada uma destas estruturas tem características histológicas típicas.(1) Figura 5

Legenda: D - túbulo contornado distal G – glomérulo de Malpighi P – túbulo contornado proximal

Vamos dar mais ênfase ao cortéx, mais propriamente aos túbulos renais proximais e distais.


Características histológicas típicas dos túbulos renais
Túbulos contornados proximais

O túbulo contornado proximal compreende 2 porções: uma inicial, tortuosa, situada próximo do glomérulo renal, e uma parte rectilínea que penetra na medula e continua-se com a ansa de Henle.(1)
Figura 6

A parede do túbulo proximal é formada por epitélio cúbico simples.

As células desse epitélio têm o citoplasma fortemente acidófilo devido à presença de numerosas mitocôndrias alongadas.
A porção da membrana celular em contacto com o lúmen do túbulo apresenta numerosas microvilosidades que formam uma orla em escova.
Os limites entre as células destes túbulos dificilmente se observam ao microscópio ótico, devido aos seus prolongamentos laterais que se cruzam com os das células vizinhas.
O túbulo contornado proximal recebe o ultrafiltrado do espaço urinário da cápsula de Bowman. As suas células epiteliais cubóides têm na sua superfície microvilosidades que lhes conferem a especialização na absorção e transporte de fluídos.

Túbulos contornados distais

Quando a parte espessa da ansa de Henle entra na zona cortical, torna-se tortuosa, passando a designar-se túbulo contornado distal.(1)

Figura 7

A parede do túbulo distal é formada por epitélio cúbico simples.

As células epiteliais são mais pequenas, comparativamente às células dos túbulos contornados proximais, possuem menos mitocôndrias, não sendo tão acidófilas.

A parte apical destas células apresenta microvilosidades curtas, não formando uma orla em escova.

As células apresentam, na sua metade basal, pregas que se encaixam nas células vizinhas, tal com as células dos túbulos proximais.


Nesta publicação vai ser abordada a nefrotoxicidade induzida por uma substância química utilizada com anticongelante na indústria automóvel, o etilenoglicol.
O etilenoglicol é uma substância barata e facilmente disponível.(2) A sua ingestão pode ocorrer acidentalmente, por crianças, ou intencionalmente, como forma de suicídio. A intoxicação com etilenoglicol é uma emergência médica que, se não tratada prontamente, leva a depressão do sistema nervoso central, comprometimento cardiovascular e insuficiência renal.(3) Tratando-se de uma substância altamente tóxica, o diagnóstico e tratamento precoces são essenciais para diminuir a mortalidade e a morbilidade.(2)(3)
A elevada toxicidade do etilenoglicol está relacionada com a acidose metabólica resultante da biotransformação do etilenoglicol nos seus metabolitos tóxicos: o ácido glicólico causa uma acidose metabólica severa(3) e o oxalato precipita sob a forma de cristais de oxalato de cálcio nos rins e outros órgãos, sendo os cristais também eliminados na urina.

A deposição dos cristais de oxalato de cálcio no rim ocorre nas células epiteliais dos túbulos contornados proximais, levando à alteração das suas características histológicas típicas (Fig.4).
Para melhor compreensão das manifestações clínicas e alterações renais causadas pelo etilenoglicol, apresenta-se um caso clínico encontrado num dos artigos(2) da pesquisa realizada:

Caso ClínicoHistória clínica e exame físico


Homem de 18 anos, com história de asma, dirigiu-se ao serviço de urgência com queixas de náuseas, vómitos, dor abdominal difusa e mal-estar geral, sintomas que se manifestam há 2 dias.
Os seus sinais vitais foram avaliados: Pressão arterial – 150/100mmHg; Temperatura retal – 37,9ºC; Pulso – 84.
O indivíduo encontrava-se letárgico mas desperto e orientado em relação ao tempo, espaço e pessoas.

Exames laboratoriaisForam feitas análises toxicológicas à urina e sangue, que se revelaram negativas.
O paciente foi admitido por acidose metabólica e insuficiência renal.
Ao quinto dia de internamento hospitalar, a função renal deteriorou-se e a creatinina sérica atingiu os 11.9 mg/dL.

Exames imagiológicosEcografia revelou rins aumentados, com edema e ecogénicos, observação compatível com insuficiência renal aguda.


Biópsia renalRevelou necrose tubular renal aguda e deposição de cristais de oxalato de cálcio, (Fig.8) apoiando o diagnóstico de intoxicação por etilenoglicol.

Figura 8

Notar os cristais de Oxalato de Cálcio Mono-hidratado depositados nos túbulos contornados proximais e as células necrosadas.

Figura 9Notar as células edemaciadas com citoplasma aumentado e mais claro, com vacúolos.


O doente negou ter ingerido etilenoglicol.
Etilenoglicol não foi detectado em amostras de soro armazenadas desde a admissão.
O doente fez tratamento de hemodiálise durante 3 semanas, resultando na recuperação completa da função renal.
Vinte e quatro meses após esta admissão, o doente não demonstrou nenhuma evidência clínica ou laboratorial de disfunção renal [creatinina sérica, 97 mmol /L (1,1 mg / dL); uréia, 4,3 mmol /L (12 mg / dL)].

DiscussãoO etilenoglicol uma vez ingerido é metabolizado em ácido glicólico e oxalato. O primeiro é responsável pela acidose metabólica (primeiro sinal clínico da intoxicação).
O oxalato precipita sob a forma de cristais de oxalato de cálcio que são internalizados pelas células epiteliais dos túbulos contornados proximais, por um processo que envolve a adesão às membranas celulares das células epiteliais tubulares.(4) Os cristais de oxalato de cálcio induzem alterações da estrutura e função da membrana celular, levam ao aumento da permeabilidade mitocondrial (resulta na inibição da função respiratória da mitocôndria)(5) e causam um aumento das espécies reactivas de oxigénio por inibição da actividade da sucinato desidrogenase. Todas estas alterações induzem a morte celular por necrose.
Estudos recentes demonstram de modo definitivo que a acumulação de cristais de oxalato de cálcio monohidratado no tecido renal induzem necrose tubular renal que leva a insuficiência renal.(5) A extensão da lesão renal está directamente relacionada com o grau de acumulação de cristais de oxalato de cálcio nas células epiteliais dos túbulos proximais renais.(4)
O diagnóstico definitivo da insuficiência renal aguda secundária à intoxicação por etilenoglicol está dependente da visualização, após biópsia renal, da deposição de cristais de oxalato de cálcio dentro das células epiteliais tubulares e necrose generalizada do epitélio tubular nos túbulos contornados proximais.(7)


Anexo



Bibliografia
(1) Junqueira LC, Carneiro J, Histologia Básica, 9ª ed, Guanabara Koogan, Rio de Janeiro, 1999
(2) Eder AF, Mcgrath CM, et all, Ethylene glycol poisoning: toxicokinetic and analytical factors affecting laboratory diagnosis, The American Association for Clinical Chemistry, 1998
(3) Egbert PA, Abraham K, Ethylene glycol intoxication: pathophysiology, diagnosis, and emergency management, PubMed, ANNA J, June 1999.
(4) Hovda KE, Guo C, Austin R, McMartin KE, Renal toxicity of ethylene glycol results from internalization of calcium oxalate crystals by proximal tubule cells, PubMed, Toxic Lett, February 2010.
(5) McMartin KE, Wallace KB, Calcium oxalate monohydrate, a metabolite ok ethylene glycol, is toxic for rat renal mitochondrial function, PubMed, Toxicol Sci, March 2005.
(6) McMartin K, Are calcium oxalate crystals involved in the mechanism of acute renal failure in ethylene glycol poisoning?, PubMed, Clin Toxicol (Phila), November 2009.
(7) Takahashi S, et all, Brain death with calcium oxalate deposition in the kidney: clue to diagnosis of ethylene glycol poisoning, PubMed, Leg Med (Tokyo), January 2008.
http://dicasderadiologia.com.br/site/2011/02/resumo-sobre-a-anatomia-do-sistema-urinrio/
http://acriticacatarinense.blogspot.com/2011/04/cientistas-criam-rim-humano-partir-de.html
https://sites.google.com/site/geologiaebiologia/geologia-e-biologia-10o/conteudos-de-biologia/regulao-nos-seres-vivos/regulao-nervosa-e-hormonal-nos-animais/osmorregulao/sistema-urinrio-do-homem
http://acd.ufrj.br/labhac/figura70.htm
http://anatpat.unicamp.br/lamuro1.html
http://www.ff.up.pt/toxicologia/monografias/ano1011/etilenoglicol/index_ficheiros/Page759.htm

Tecido epitelial pavimentoso e carcinoma orofaríngeo

Linda Costa

O artigo “Case-Control Study of Human Papillomavirus and Oropharyngeal Cancer” do The New England Journal of Medicine, despertou-nos a curiosidade para o tentar compreender, não só do ponto de vista epidemiológico, mas também a nível histológico e biopatológico.

Figura 1- Caso representativo de carcinoma das células pavimentosas orofaríngeas

O referido artigo conclui que a infeção oral por HPV está na etiopatogénese do carcinoma das células pavimentosas da orofarínge. Deste modo, para interpretar estas imagens de um caso representativo de carcinoma das células pavimentosas orofaríngeas, quisemos fazer uma pesquisa.

Mas afinal, o que são células pavimentosas (squamous cells)?

As células pavimentosas são um tipo de tecido epitelial.
O tecido epitelial pode ser classificado da seguinte forma:


Figura 2 – Tipos de epitélio de revestimento

O tecido pavimentoso é composto por células alongadas, com núcleo alongado. Pode ser simples ou estratificado, de acordo com o número de camadas.



Tecido pavimentoso simples
Apresenta apenas uma camada de células, em contacto com a lâmina basal do epitélio, achatadas e alongadas, com núcleo achatado. Pode ter várias funções, como de revestimento, absorção e difusão de moléculas. Reveste os vasos, designando-se endotélio; e as cavidades pleural, pericárdica e peritoneal, designando-se mesotélio.


Figura 3 - Tecido epitelial pavimentoso simples de uma artéria do intestino delgado


Tecido pavimentoso estratificadoComposto por células epiteliais pavimentosas, em múltiplas camadas, sobre a membrana basal. Tem como função: proteção, revestimento e resistência.
Subdivide-se em queratinizado e não queratinizado.
O tecido queratinizado apresenta a camada mais superficial de queratina, que é composta por células anucleadas, e está presente na pele e na língua.

Figura 4 - Tecido epitelial pavimentoso estratificado queratinizado da pele (pé)

O tecido não queratinizado apresenta a camada mais superficial composta por células nucleadas, e está presente na cavidade oral, orofaringe, esófago, traqueia, vagina.

Figura 5 - Tecido epitelial pavimentoso estratificado não queratinizado da orofaringe (amígdalas)


Deste modo, podemos compreender que as células pavimentosas da orofaringe referidas no artigo, reportam ao tecido pavimentoso estratificado não queratinizado. Falta perceber as alterações carcinogénicas do HPV na orofarínge.

Carcinoma orofaríngeo e infeção por HPVO vírus do papiloma humano, particularmente o HPV-16, é um fator carcinogénico das células pavimentosas da orofaringe, assim como, o uso excessivo de álcool e tabaco. 90 por cento dos carcinomas das células pavimentosas da cabeça e pescoço associados a HPV, são referentes à estirpe HPV-16.
A infeção por HPV geralmente é adquirida por via sexual, através de contacto oral-genital, embora também possa ser por contacto boca-a-boca. Comportamentos sexuais de risco e múltiplos parceiros sexuais são considerados fatores de risco para o carcinoma orofaríngeo associado ao HPV.

Figura 1A - Carcinoma orofaríngeo in situ das células pavimentosas
Figura 1B - Hibridização in situ (HPV-16 positivo)



Figura 1C – Carcinoma do tecido epitelial pavimentoso das amígdalas (ninhos invasivos profundos)
Figura 1D – Hibridização in situ (HPV-16 positivo)


Nas figuras 1B e 1D, os pontos castanhos, correspondem ao núcleo das células cancerígenas.

O HPV-16 é um vírus muito ativo, que tem capacidade de integrar sequências do seu DNA no genoma da célula hospedeira. A expressão dos oncogenes E6 e E7, dado que têm a capacidade de induzir a transformação maligna das células infectadas, conduz à inativação dos genes supressores tumorais p53 e Rb (retinoblastoma), respectivamente. Atinge preferencialmente as amígdalas e a base da língua. As lesões causadas pela infeção por HPV-16 conduzem ao carcinoma orofaríngeo in situ das células pavimentosas, podendo evoluir, com grande probabilidade, para carcinoma invasivo.

O carcinoma in situ é uma lesão pré-invasiva, em que as alterações displásicas (crescimento desordenado) são pronunciadas e afetam toda a espessura do epitélio.
O HPV para além de causar lesão celular, induz proliferação e transformações celulares.
Paralelamente à desorganização arquitetónica, verifica-se a existência de hiperplasia patológica (mitoses atípicas), pleomorfismo celular e núcleos hipercromáticos.

O desenvolvimento do cancro orofaríngeo está associado a etiopatogenias distintas: infeção por HPV e o uso excessivo de álcool e/ou de tabaco. Os doentes com carcinoma das células pavimentosas orofaríngeas, que apresentam tumores HPV positivos têm melhor prognóstico do que os que apresentam tumores HPV negativos. Os tumores orofaríngeos HPV positivos respondem muito melhor à radioterapia e à quimioterapia, comparativamente àqueles relacionados somente ao tabaco e ao álcool.
O risco de carcinoma orofaríngeo está aumentado em mulheres com história familiar desta neoplasia. Dentição em más condições, pouca higiene oral e visitas infrequentes ao dentista são fatores associados ao aumento de risco para o carcinoma das células pavimentosas orofaríngeas. Infeções dentárias e coinfeção da colo do útero (por exemplo, chlamydia trachomatis) aumentam o risco desta neoplasia.
A vacinação contra o HPV, em ambos os sexos, é de extrema importância na prevenção, uma vez que, apesar de não abranger todas as estirpes do vírus, confere imunidade às mais agressivas. Assim, a incidência de carcinoma orofaríngeo e do colo do útero irá diminuir na população vacinada.




Anexo
http://www.nejm.org/doi/full/10.1056/NEJMoa065497



Bibliografia
• Rampias T, Sasaki C, Weinberger P, Psyrri A. E6 and E7 gene silencing and transformed phenotype of human papillomavirus 16-positive oropharyngeal cancer cells. J Natl Cancer Inst 2009;101:412-23.
• Ragin CC, Taioli E. Survival of squamous cell carcinoma of the head and neck in relation to human papillomavirus infection: review and meta-analysis. Int J Cancer 2007;121:1813-20.
• Gypsyamber D’Souza et col., Case–Control Study of Human Papillomavirus and Oropharyngeal Cancer, N Engl J Med 2007;356:1944-56.
• Zelmanowicz Ade M, Schiffman M, Herrero R, et al. Family history as a co- factor for adenocarcinoma and squamous cell carcinoma of the uterine cervix: results from two studies conducted in Costa Rica and the United States. Int J Cancer 2005;116:599-605.29.
• Junqueira LC, Carneiro J, Histologia Básica, 10ª Edição, Guanabara Koogan, Rio de Janeiro, 2004.
• Moreno-Lopez LA, Esparza-Gomez GC, Gonzalez-Navarro A, Cerero-Lapiedra R, Gonzalez-Hernandez MJ, Dominguez-Rojas V. Risk of oral cancer associated with tobacco smoking, alcohol consumption and oral hygiene: a case-control study in Madrid, Spain. Oral Oncol 2000;36:170-4.32.
• Miguel RE, Villa LL, Cordeiro AC, et al. Low Prevalence of human papillomavirus in a geographic region with incidence of head and neck cancer. Am J Surg.1998;176(5):428-9.
• Kierszenbaum A., Histology and Cell Biology, 2º Edição, Williams & Wilkins, Baltimore, 1991
http://141.214.65.171/Histology

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Histo é um blog!

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Turma 1
Mestrado em Medicina - Universidade de Aveiro (em colaboração com a UP/ICBAS)